Mulheres no estudo da astronomia


Mulheres no estudo da astronomia

Tosi afirma que a Astronomia foi a ciência que mais despertou o interesse dos homens e mulheres burgueses e nobreza por conta das descobertas realizadas por Newton e o estabelecimento das leis dos movimentos planetários estabelecidos por Kepler. Nesse momento a astronomia demandava não apenas conhecimento teórico, mas também prático como, por exemplo, polimento de lentes e fabricação de instrumentos, como também o desenvolvimento de cálculos. Esse se tornou o momento de participação das mulheres ocupando posições secundárias. (TOSI, 1998, p.384) Não diferindo do restante das ciências, os nomes das mulheres começam a aparecer na astronomia à sombra dos homens fosse, pai, irmão ou marido cientistas, a quem ajudavam em seus trabalhos, observações, nos cálculos e nas classificações ou no prosseguimento das pesquisas depois da morte dos mesmos.
No século XVIII, as astrônomas mais famosas foram Caroline Herchel (1750-1848) e Maria Winkelmann (1670-1720). Caroline trabalhou com o irmão, William, na fabricação de telescópios e observação das estrelas. O governo britânico concedeu uma pensão de £200 anuais a William por seu descobrimento de Urano. Anos depois foi a vez de Caroline ganhar uma pensão estatal de £50 pela descoberta de nove cometas. Tornou-se assim a primeira mulher a ser remunerada por seus trabalhos.
Já Maria Winkelman enfrentou muita oposição acadêmica. Winkelman aprendeu com o astrônomo Christoph Arnold e trabalhou em seu observatório como aprendiz realizando observações, cálculos e preparação de calendários. Posteriormente, casou-se com Gottfried Kirch também astrônomo e quando este ingressou na Academia de Berlim, Maria tornou-se sua assistente, mas sem um cargo oficial. Em 1702, Maria descobriu um cometa, contudo seu marido levou o crédito pela descoberta que, oito anos depois, reconheceu que a observação havia sido feita pela esposa. Nesse momento, após a morte do marido, não obteve o cargo de assistente que tinha em vista para continuar a confecção dos calendários. Maria continuou seus trabalhos em casa com seu filho, Chrisfried. Voltou a Academia em 1716 para ser sua assistente dele. Contudo, após sucessivas críticas, Maria, no ano seguinte, retirou-se definitivamente para fazer suas observações em casa.
Nicole-Reyne Etable de la Brière (1723-1788), conhecida como Madame Lepaute interessava-se por matemática e astronomia. Em 1757, foi incumbida por Joseph Jérôme de Lalande, também astrônomo de realizar os cálculos para determinar a data da reaparição do cometa Halley. Esse trabalho altamente complexo foi solicitado a Lalande pelo astrônomo e matemático Alexis-Claude Clairault. Posteriomente, Lalande afirmou que sem ela não poderia executar a árdua tarefa, nada obstante o mérito foi atribuído a Clairault. Como autora, efetivamente, figura em sua dissertação sobre o eclipse anular do sol de 1764.
No século XIX, nos Estados Unidos, muitas mulheres começaram a empreender trabalhos nas “áreas da astronomia de posição, à espectrografia, à fotometria em mais tarde à espectroscopia”. (MOURÃO, 2009, p.31) Maria Mitchell (1818-1889) foi admitida como professora de astronomia em 1876.
Um fato marcante no século XIX foi um trabalho desenvolvido no Observatório Astronômico de Harvard. O astrônomo Edward Pickering contratou uma composta apenas por mulheres para desenvolver um sistema de classificação das estrelas. Era composta pelas físicas: Anna Palmer, Williamina Fleming (1857-1911), Antonia Maury (1866-1952), Annie Cannon (1863-1941) e Enrietta Leavitt (1868-1921). Garcia afirma que o motivo pela contratação de mulheres foi o orçamento limitado (os salários das mulheres eram menores). O trabalho consistia em cálculos muito complexos e, por fim, o sistema revolucionou a astronomia sendo usado até os dias de hoje. Leavitt descobriu as estrelas variáveis, ela faleceu em 1921 e foi indicada para o Prêmio Nobel de Física em 1925. Posteriormente, Cannon desenvolveu um sistema de classificação de estrelas (sistematizando mais de 400 mil estrelas) que foi adotado como pela União Astronômica Internacional.
Na America Latina, atualmente, as mulheres ocupam cerca de 30% a 40% do total. No Brasil, a primeira astrônoma profissional foi Yeda Veiga Ferraz Pereira (1925-) que trabalhou no Observatório Nacional, em 1950. Nos anos 80, ela empenhou-se na disseminação de pesquisas e na criação de cursos de astronomia pelo Brasil. Na atualidade, Heloisa Boechat é Diretora do Observatório do Valongo, ligado à UFRJ e entrou para a história da ciência como a primeira mulher a comandar um observatório no Brasil.
“Hoje muitas mulheres se dedicam as carreiras científicas, mas foram necessários muitos anos de lutas nessa direção” (MOURÃO, 2009, p.32). Além disso, muitos autores acreditam que a participação das mulheres na construção da ciência é muito maior do que se sabe, tendo em vista, principalmente algumas das personalidades femininas já citadas. Para Garcia o
“esquecimento da mulher na ciência foi criado durante séculos e os historiadores, voluntariamente ou não, ocultaram a presença das mulheres nas atividades cientificas. Talvez por desconhecimento, talvez por receio ou mesmo pelo machismo impregnado na cultura humana”. (GRACIA, 2010)  
De fato, sabe-se hoje que muitas mulheres que trabalharam em parceria com seus familiares são pouco citadas (ou omitidas) em seus resultados finais e por conseqüência sendo esquecidas pela história da ciência. Logo, ainda existe um longo caminho para resgatar essa história da ciência feita pelas mulheres.

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English version

Women in the study of astronomy


Tosi states that astronomy was the science that most aroused the interest of bourgeois men and women and nobility because of the discoveries made by Newton and the establishment of the laws of planetary movements established by Kepler. At that time astronomy demanded not only theoretical knowledge, but also practical, such as, for example, lens polishing and instrument making, as well as the development of calculations. This became the moment of participation of women occupying secondary positions. (TOSI, 1998, p.384) Not unlike the rest of the sciences, women's names begin to appear in astronomy in the shadow of men, whether they were father, brother, or husband scientists, whom they assisted in their work, observations, calculations, and in the classifications or in the continuation of the research after their death.

In the eighteenth century, the most famous astronomomas were Caroline Herchel (1750-1848) and Maria Winkelmann (1670-1720). Caroline worked with her brother, William, on making telescopes and stargazing. The British government granted a pension of £ 200 annually to William for his discovery of Uranus. Years later it was Caroline's turn to win a £ 50 state pension for the discovery of nine comets. She became the first woman to be paid for her work.

Already Maria Winkelman faced a lot of academic opposition. Winkelman learned from the astronomer Christoph Arnold and worked in his observatory as an apprentice making observations, calculations, and preparing calendars. He later married Gottfried Kirch, an astronomer, and when he entered the Berlin Academy, Maria became his assistant, but without an official post. In 1702, Maria discovered a comet, but her husband took credit for the discovery which, eight years later, acknowledged that the remark had been made by the wife. At that moment, after the death of her husband, she did not obtain the position of assistant that was in view to continue the preparation of the calendars. Mary continued her work at home with her son, Chrisfried. He returned to the Academy in 1716 to be his assistant. However, after repeated criticisms, Maria, the following year, retired definitively to make her observations at home. 

Nicole-Reyne Etable de la Brière (1723-1788), known as Madame Lepaute was interested in mathematics and astronomy. In 1757, it was commissioned by Joseph Jérôme de Lalande, also astronomer to perform the calculations to determine the date of the reappearance of the comet Halley. This highly complex work was asked of Lalande by the astronomer and mathematician Alexis-Claude Clairault. Subsequently, Lalande stated that without her she could not perform the arduous task, but the merit was attributed to Clairault. As an author, she effectively figures in her dissertation on the annular solar eclipse of 1764.

In the 19th century, in the United States, many women began to undertake works in the "astronomy areas from position, to spectrography, to photometry in later to spectroscopy". (MOURÃO, 2009, p.31) Maria Mitchell (1818-1889) was admitted as a professor of astronomy in 1876.

A striking fact in the nineteenth century was a work developed at the Harvard Astronomical Observatory. Astronomer Edward Pickering has hired only women to develop a star rating system. It was composed by the physicists: Anna Palmer, Williamina Fleming (1857-1911), Antonia Maury (1866-1952), Annie Cannon (1863-1941) and Enrietta Leavitt (1868-1921). Garcia states that the reason for employing women was the limited budget (women's wages were lower). The work consisted of very complex calculations and, finally, the system revolutionized astronomy being used to this day. Leavitt discovered the variable stars, passed away in 1921 and was nominated for the Nobel Prize in Physics in 1925. Later Cannon developed a star classification system (systematizing more than 400,000 stars) that was adopted by the International Astronomical Union.

In Latin America, currently, women occupy about 30% to 40% of the total. In Brazil, the first professional astronomer was Yeda Veiga Ferraz Pereira (1925-) who worked at the National Observatory in 1950. In the 1980s she was involved in the dissemination of research and the creation of astronomy courses in Brazil. Currently, Heloisa Boechat is Director of the Valongo Observatory, linked to UFRJ and has entered the history of science as the first woman to command an observatory in Brazil.

"Today, many women dedicate themselves to scientific careers, but it took many years of struggle in this direction" (MOURÃO, 2009, p.32). Moreover, many authors believe that the participation of women in the construction of science is much greater than is known, especially in view of some of the female personalities already mentioned. For Garcia the

 "Forgetfulness of women in science was created for centuries, and historians, whether willingly or not, concealed the presence of women in scientific activities. Maybe out of ignorance, perhaps out of fear or even the machismo impregnated in human culture. " (GRACIA, 2010)

In fact, it is known today that many women who have worked in partnership with their family members are rarely cited (or omitted) in their final results and consequently being forgotten by the history of science. Therefore, there is still a long way to rescue this history of science made by women.

Leia também nosso texto sobre mulheres na ciência.

Crédito do texto: Bianca Costa

Referência / Reference
  
GARCIA, S. Eloi. A mulher e a ciência. Fiocruz. Disponível em: <http://www.fiocruz.br/ccs/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=582&sid=4> Acesso: 23 abr. 2010

MOURÃO, Ronaldo Rogério de Freitas. As mulheres na astronomia. In: Urânia – Publicação da Associação de Amigos do Museu de Astronomia. Ano 2, nº3. p. 28-32. abril 2009.

TOSI, Lúcia. Mulher e ciência - A Revolução científica, a caça às bruxas e a ciência moderna. In: Cadernos Pagu. (10) pp.369-397. 1998. Disponível em: <http://www.pagu.unicamp.br/files/cadpagu/Cad10/pagu10.14.pdf> Acesso: 23 abr. 2010.

Imagem. Computadores de Harvard. Disponível: <http://cafecomciencia.wordpress.com/2009/10/> Acesso: 28 jan. 2011.


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