Comissão Cruls
A idéia de transferência da Capital Federal para o interior do
território brasileiro não era nova
desde 1808, pelo menos quando a
família real portuguesa veio buscar abrigo no Brasil, havia sido notada a
vulnerabilidade do Rio de Janeiro no caso de guerras navais, e aventada a
possibilidade de transferir a capital para o interior. (MAST, 2004, p. 35)
Somando-se à razão acima apontada, havia ainda a percepção de que
a cidade do Rio de Janeiro era insalubre, e, principalmente, de que era importante
povoar o interior do território brasileiro. A mudança da capital já era
prevista na Constituição Federal de 1891, artigo 3º, que dizia: “Fica
pertencendo à União, no planalto central da República, uma zona de 14.400 quilômetros
quadrados, que será oportunamente demarcada para nela estabelecer-se a futura
Capital federal”. (BARROS, 1891) Contudo, a instabilidade política dos anos
iniciais da República viria a acelerar a iniciativa de demarcar a área da nova
capital.
Rapidamente o Congresso Nacional conseguiu aprovar junto à Lei
Orçamentária a quantia necessária para financiar uma equipe capaz de demarcar a
área da nova Capital. Logo em seguida, o Ministro da Agricultura Antão
Gonçalves de Faria, por meio da portaria 119-A de 17 de maio de 1892, criou a
Comissão Exploradora do Planalto Central do Brasil, estabelecendo Luis Cruls
(1948-1908) como seu chefe. Nessa época, Cruls também era professor da Escola
Militar e diretor do Observatório Nacional. Na mesma portaria o Ministro ainda
especificou as atividades que deveriam ser realizadas pela Comissão:
[...] deveis proceder aos estudos
indispensáveis ao conhecimento exato da posição astronômica da área a demarcar,
da orografia, hidrografia, condições climáticas e higiênicas, natureza do
terreno, quantidade e qualidade das águas, que devem ser utilizadas para o
abastecimento, materiais de construção, riqueza florestal, etc... da região
explorada e tudo mais que diretamente se ligue ao assunto que constitui o
objeto da vossa missão. No decurso de tais trabalhos e tanto quanto possível,
podereis realizar não só os estudos que julgardes de vantagem e utilidade para
mais completo desempenho do vosso encargo, mais ainda de valor científico com
relação a essa parte ainda pouco explorada do Brasil (CRULS, 1893, p.4.)
Rapidamente foram empreendidas ações que visavam dar início a essa
grande empreitada, e assim a Comissão pode iniciar seus trabalhos in situ, realizando os estudos requeridos e concluindo, posteriormente,
os cálculos e mapas. Em julho de 1893 foi publicado no Diário Oficial um resumo
que viria a ser o Relatório Parcial
da Comissão e no ano seguinte, deu-se a publicação do texto completo,
denominado Relatório da Comissão
Exploradora do Planalto Central do Brasil. Nesse último, foi descrito
detalhadamente todo o trabalho realizado pela Comissão, incluindo diversos
relatórios de integrantes do grupo, tabelas e fotografias.
Deve ser ressaltado que houve uma segunda Comissão denominada
“Comissão de Estudos da Nova Capital da União (1894-1895)” que foi composta por
muitos integrantes da primeira. O objetivo dessa última comissão consistia em
determinar o melhor lugar para fixar a Nova Capital dentro da área
anteriormente demarcada.
Tanto o Relatório Parcial quanto o Relatório de 1894 listam os
militares que participaram da Comissão sem mencionar suas patentes, mas deve
ser notado que Cruls escolheu todos os membros “entre os servidores do
Observatório Astronômico e os engenheiros militares, em geral, seus ex-alunos
na Escola Superior de Guerra”. (MOURÃO, 2003, p.31) Assim, além de Cruls, a
Comissão era formada pelos seguintes funcionários do Observatório Astronômico:
Henrique Charles Morize e Julião de
Oliveira Lacaille (1851-1925), classificados como astrônomos; Eduardo Chartier
como mecânico, e Francisco Souto, como ajudante-mecânico. Entre os membros
ex-alunos de Cruls na Escola Militar estavam os Tenentes Augusto Tasso Fragoso
(1869-1945), realizando trabalhos de ajudante e secretário; Hastimphilo de
Moura, Alípio Gama (1863-1935), o 1º Tenente Antonio Cavalcanti de Albuquerque
e o Capitão Celestino Alves Bastos como ajudantes. Pedro Carolino Pinto de
Almeida é citado no Relatório como comandante do contingente militar, e Joaquim
Rodrigues de Siqueira Jardim e Henrique Silva como sendo seus alferes. Também constava o nome
do Major Pedro Gouvêa, que era médico, e do Capitão Alfredo José Abrantes,
farmacêutico. A Comissão incluía também Antonio Martins de Azevedo Pimentel,
denominado higienista; Eugenio Hussak, geólogo; Ernesto Ule, botânico;
Felicissimo do Espírito Santo, Antonio Jacintho de Araujo Costa, José Paulo de
Mello e João de Azevedo Peres Cuyabá, auxiliares.
Pessoal da Comissão (CRULS, 1894a, p.8)
A
Comissão Exploradora do Planalto Central viajou com um pesado carregamento, que
abrangia barracas, mantimentos, armamentos, instrumentos científicos (como
teodolitos, círculos meridianos, sextantes, micrômetros, lunetas, heliotrópios,
níveis, cronômetros, relógios, barômetros de Fortin, bússolas, aneróides, e
podômetros). Além disso, o Relatório de 1894 salienta a presença nesse
carregamento de câmeras fotográficas, material para revelação e ferramentas de
uma pequena oficina dedicada ao conserto de instrumentos que pudessem ser
danificados no trajeto. Esse mesmo documento apresenta um cálculo aproximado do
peso de todo esse equipamento, em torno de 10 toneladas.
Foram realizadas também observações sobre o clima, a água e os
materiais disponíveis para construção. Sobre o clima, apesar das medições terem
sido diárias, o tempo de observação foi insuficiente para determinar com
exatidão a temperatura anual da região delimitada. Quanto ao sistema
hidrográfico foi realizado um mapeamento e medição do volume de água dos rios e
seus principais afluentes, evidenciando que se tratava de uma área muito rica
sob esse aspecto. O Relatório ressalta que os responsáveis por essas medições
foram Henrique Morize, Alípio Gama e Antonio Cavalcanti. Já com relação aos
materiais de construção foi observado que a região não possuía muitas
florestas, enquanto que as pedras que poderiam ser usadas para construção como,
por exemplo, o calcário e a argila, foram identificadas em abundância.
Referência
COSTA, Bianca
Mandarino. Fotografias da Comissão Cruls:
uma análise da imagem. Monografia de
Especialização apresentada à Coordenação
do Curso de Pós-Graduação
em Preservação
de Acervos de Ciência
e Tecnologia . Museu de Astronomia e
Ciências Afins. 2010. 101 p.
MUSEU DE ASTRONOMIA E CIÊNCIAS AFINS. Luiz Cruls, um cientista a serviço do Brasil.
Rio de Janeiro: Mast/MCT. 2004.
BARROS,
Prudente José de Moraes. Constituição da
República dos Estados Unidos do Brasil (de 24 de fevereiro de 1891). Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao91.htm>
Acesso: 22 out. 2010.
CRULS, Luis. Relatório Parcial apresentado ao Ministro da
Indústria, Viação e Obras Públicas. Rio de Janeiro. Lombaerts & Comp.
1893. Disponível em:
<http://www2.senado.gov.br/bdsf/bitstream/id/182932/1/000178147.pdf>
Acesso: 12 out. 2010.
CRULS, Luis. Relatório apresentado ao Ministro da Indústria,
Viação e obras públicas [da Comissão Exploradora do Planalto Central do Brasil].
Rio de Janeiro: H. Lombarts & Co., 1894a. Biblioteca Digital do Senado
Federal. Disponível em: <http://www2.senado.gov.br/bdsf/item/id/182911>
Acesso: 11 out. 2010.
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